O ministro Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), destacou a importância de "parcimônia, comedimento e compostura" do Poder Judiciário, em declaração feita na sexta-feira (28), véspera do início do recesso da Corte. Fachin sublinhou que a violação desses “deveres éticos” compromete a legitimidade dos juízes e advertiu que "abdicar dos limites é um convite para pular no abismo institucional".
Essa declaração ocorre em um momento de tensões crescentes dentro do STF e entre o Judiciário e outros poderes. Recentemente, o STF tomou a decisão de descriminalizar o porte de maconha por usuários, o que provocou reações intensas, inclusive do Congresso Nacional e do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Lula criticou a decisão, afirmando que "a Suprema Corte não tem que se meter em tudo" e sugerindo que a Corte se concentre em questões de maior relevância constitucional para evitar rivalidades desnecessárias entre o Congresso e o STF.
A declaração de Fachin também coincidiu com a participação de metade dos integrantes da Suprema Corte no Fórum Jurídico de Lisboa, evento informalmente chamado de "Gilmarpalooza", organizado pelo ministro Gilmar Mendes. A controvérsia em torno deste evento e a participação de diversos ministros só intensificou as discussões sobre os limites e a compostura que devem ser observados pelo Judiciário.
Durante a abertura da “Hora de Atualização”, atividade promovida pelo gabinete de Fachin desde agosto de 2015, o ministro expressou seu ceticismo quanto à capacidade dos tribunais de lidarem com as diferenças sociais e políticas. Ele defendeu que, em tempos de “mudanças sociais intensas”, é essencial que a Política assuma um papel protagonista, enquanto o Judiciário deve exercer a “virtude da parcimônia”.
Fachin enfatizou a necessidade de evitar a chancela de erros e assegurar a correção dos acertos, sempre com o foco na proteção dos direitos humanos e fundamentais. Ele afirmou que "comedimento e compostura são deveres éticos cujo descumprimento solapa a legitimidade do exercício da função judicante". O ministro defendeu ainda que a sociedade não pode abrir mão do “compromisso de processar politicamente” suas diferenças, argumentando que "a lei sem reconhecimento é injusta, mas o reconhecimento sem lei é precário".
A declaração de Fachin surge em um contexto de crescente escrutínio sobre o papel e os limites do Judiciário no Brasil. O debate sobre a descriminalização do porte de maconha exemplifica as divisões dentro da Corte e as reações do Congresso Nacional, refletindo um cenário político e jurídico de intensas disputas. A crítica de Lula ao STF reflete um sentimento comum entre muitos políticos, que veem a intervenção judicial em questões políticas como um fator de tensão institucional.
O "Gilmarpalooza", por sua vez, trouxe à tona questões sobre o uso de recursos públicos e a participação de ministros em eventos internacionais, gerando um debate sobre transparência e accountability. O evento envolveu gastos consideráveis com viagens e acomodações, estimados em cerca de R$ 1,3 milhão, o que gerou críticas e questionamentos sobre a necessidade e a pertinência dessas despesas.
A fala de Fachin, portanto, não se limita a um mero apelo à ética judicial, mas se insere em um contexto mais amplo de debates sobre a função e os limites do Judiciário no Brasil contemporâneo. Sua defesa de uma abordagem mais contida e parcimoniosa pelo Judiciário busca preservar a legitimidade das decisões judiciais e evitar o aprofundamento das divisões institucionais.
Nesse cenário, a atuação do STF e a interação entre os diferentes poderes da República continuarão a ser temas centrais no debate público. A necessidade de equilíbrio e respeito mútuo entre as esferas do poder é fundamental para a estabilidade e o funcionamento democrático do país. As próximas semanas, com o retorno dos ministros do recesso e a continuidade dos debates judiciais e legislativos, serão cruciais para observar como essas questões serão encaminhadas e quais serão os desdobramentos para a política e a justiça no Brasil.