Dino rebaixa empreendedores: Ter uma bicicleta, colocar um isopor nas costas e sair pedalando não é empreendedorismo


Durante o 9º Congresso Brasileiro de Direito Eleitoral, realizado em Curitiba, o magistrado Dino fez declarações contundentes sobre o fenômeno da "uberização" do trabalho, especialmente no contexto de motoristas e entregadores que utilizam plataformas digitais para intermediar suas atividades laborais.


Dino argumentou que simplesmente ter uma bicicleta, colocar um isopor nas costas e sair pedalando não pode ser considerado empreendedorismo legítimo. Ele enfatizou que essa prática desprovida de direitos trabalhistas básicos, como descanso semanal remunerado, 13º salário, férias e proteção previdenciária, representa um retrocesso aos direitos laborais conquistados ao longo de décadas.


"É evidente o papel da livre iniciativa, o qual respeito profundamente. No entanto, isso deve ser exercido dentro dos parâmetros constitucionais e garantindo os direitos fundamentais", afirmou o magistrado durante seu discurso.


Ele alertou para o impacto social e fiscal dessa realidade, chamando-a de "bomba social e fiscal". Dino argumentou que os trabalhadores que atuam nesse formato não contribuem para a previdência social, o que poderá gerar um ônus futuro para o Estado e para toda a sociedade.


"Ao envelhecerem, esses indivíduos não terão uma previdência garantida, recebendo apenas benefícios assistenciais não contributivos. Além disso, em casos de doença, serão atendidos pelo SUS, colocando em cheque a sustentabilidade do sistema de saúde pública", ressaltou o magistrado.


A posição de Dino não é isolada e reflete um debate acalorado no cenário jurídico brasileiro. A Associação Brasileira de Mobilidade e Tecnologia (Amobitec) tem defendido a regulamentação dessas atividades desde 2022, pleiteando mudanças na legislação para garantir a inclusão previdenciária dos trabalhadores de aplicativos.


A questão da "uberização" do trabalho tem sido objeto de intensa controvérsia nos tribunais brasileiros, com diferentes interpretações entre a Justiça do Trabalho e o Supremo Tribunal Federal (STF). O STF, por exemplo, tem tomado decisões que derrubam entendimentos de tribunais trabalhistas sobre o vínculo empregatício entre plataformas digitais e trabalhadores.


Em dezembro do ano passado, a primeira turma do STF firmou um posicionamento sobre o assunto ao derrubar uma decisão que reconhecia vínculo empregatício de um motorista com a plataforma Cabify. Na época, o magistrado Dino ainda não integrava o colegiado, mas os ministros foram unânimes em afirmar que a Justiça do Trabalho tem desconsiderado definições do Supremo nesse tema.


O ministro Alexandre de Moraes é um dos defensores dessa nova forma de trabalho, destacando que ela proporciona maior flexibilidade aos trabalhadores e contribui para o aumento de emprego e renda. Para Moraes, a "uberização" é uma evolução necessária que se alinha com os princípios de livre iniciativa da Constituição.


No entanto, a ministra Cármen Lúcia trouxe uma visão crítica em relação ao sistema, expressando preocupação com a falta de direitos sociais garantidos para os trabalhadores desse formato. Ela enfatizou que aplicar simplesmente a legislação trabalhista tradicional não é suficiente, dada a natureza diferente dessa relação laboral.


"A chamada 'uberização' e 'pejotização' tornaram-se realidade na vida das pessoas, mas é essencial considerar como isso impacta a seguridade social e os direitos fundamentais dos trabalhadores", ponderou a ministra.


Diante desses debates e decisões judiciais divergentes, o futuro do trabalho intermediado por aplicativos no Brasil continua incerto. Enquanto as plataformas defendem a inovação e a criação de novas oportunidades de trabalho, críticos alertam para os riscos de precarização e desproteção dos direitos trabalhistas conquistados ao longo de décadas.


A discussão deve continuar nos tribunais e no Legislativo, onde são esperadas novas iniciativas para regulamentar essa nova realidade do mercado de trabalho digital no país. Enquanto isso, o posicionamento do STF continua sendo central para definir os rumos legais dessa questão complexa e multifacetada.
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