Uma nova reportagem publicada pela Folha de S.Paulo trouxe à tona mais detalhes sobre as ações do ministro Alexandre de Moraes no uso do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) para investigações contra aliados do ex-presidente Jair Bolsonaro. A matéria revela erros e contradições envolvendo o uso de um órgão do TSE para justificar bloqueios em redes sociais e a condução de investigações sigilosas.
De acordo com a Folha, o jornal obteve acesso a seis gigabytes de mensagens entre Moraes e seus assessores, que revelam como o ministro utilizou informalmente a Assessoria Especial de Enfrentamento à Desinformação (AEED) do TSE para alimentar inquéritos criminais que tramitavam no Supremo Tribunal Federal (STF). Um exemplo emblemático é o processo envolvendo o ex-deputado estadual Homero Marchese, cujas redes sociais foram bloqueadas a pedido de Moraes com base em informações equivocadas.
O caso começou em novembro de 2022, quando Moraes recebeu relatórios do TSE sobre postagens que supostamente incitavam manifestações contra ministros do STF em Nova York. As mensagens mostram que, naquela noite, o juiz Airton Vieira, braço direito de Moraes no STF, enviou arquivos pelo WhatsApp para Eduardo Tagliaferro, então chefe da AEED. Os documentos destacavam a localização do hotel onde os ministros ficariam hospedados e pediam que o TSE identificasse e bloqueasse as contas responsáveis pelas postagens. Tagliaferro, porém, manifestou dúvidas sobre como bloquear os conteúdos pelo TSE, já que as postagens não tinham relação direta com as eleições.
Mesmo diante dessa dúvida, o relatório do TSE foi produzido e enviado ao STF. No entanto, em vez de registrar que o pedido veio diretamente do gabinete de Moraes, o documento foi apresentado como tendo sido originado de forma "anônima". O relatório também apresentou um erro ao atribuir a autoria de uma das postagens ao ex-deputado Homero Marchese, o que levou Moraes a determinar o bloqueio das redes sociais de Marchese sob a justificativa de que ele estaria divulgando informações que poderiam colocar em risco a segurança dos ministros do STF.
O bloqueio foi realizado no mesmo dia 13 de novembro, com as plataformas tendo apenas duas horas para cumprir a ordem, sob pena de multa. Marchese ficou com suas contas no Twitter e Facebook bloqueadas por cerca de um mês e meio, enquanto seu Instagram permaneceu inacessível por quase seis meses. Somente em maio de 2023, após uma decisão da Justiça do Paraná, Marchese conseguiu reativar sua conta no Instagram.
A reportagem da Folha também aponta contradições nas declarações feitas por Moraes no STF. Em uma sessão plenária, o ministro afirmou que todos os alvos dos relatórios do TSE já eram investigados nos inquéritos das fake news ou das milícias digitais, ambos sob sua relatoria. Contudo, os documentos obtidos pelo jornal mostram que Homero Marchese não era investigado anteriormente nesses inquéritos e que os recursos apresentados contra as decisões de Moraes, incluindo um agravo regimental da Procuradoria-Geral da República (PGR), não foram analisados.
A Folha destaca ainda que, no dia 23 de dezembro de 2022, Moraes decidiu desbloquear as contas de Marchese no Twitter e no Facebook, mencionando um ofício do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, que solicitava a revogação de bloqueios de contas de parlamentares. Entretanto, Moraes não abordou a questão do Instagram, o que levou Marchese a recorrer novamente ao STF em março de 2023, pedindo a reativação de sua conta.
As revelações trazidas pela reportagem reforçam as críticas ao uso do TSE para fins que vão além do combate à desinformação eleitoral. A matéria sugere que houve um uso excessivo e inadequado dos poderes de polícia do tribunal, com decisões sendo tomadas sem o devido processo legal e baseadas em informações incorretas. Além disso, a reportagem levanta questões sobre a transparência e a imparcialidade nas ações de Moraes, uma vez que o ex-deputado teve suas redes bloqueadas sem que houvesse uma análise cuidadosa dos fatos e das provas.
Essas novas revelações certamente intensificarão o debate sobre o papel do TSE e do STF no combate à desinformação e na proteção da democracia. Elas também podem aumentar a pressão sobre Alexandre de Moraes, que já vinha sendo alvo de críticas por sua postura firme e, em alguns casos, controversa em relação às investigações envolvendo apoiadores de Bolsonaro. A reportagem da Folha deixa claro que a atuação do ministro e a utilização de órgãos judiciais para fins políticos estão longe de ser um assunto encerrado.