Em meio a um clima tenso e um debate público intenso, as declarações do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, sobre as eleições e os resultados em unidades prisionais, continuam a reverberar. Tarcísio abordou, no último domingo (27), questões relacionadas ao desempenho eleitoral do candidato do PSOL, Guilherme Boulos, em setores específicos da população carcerária de São Paulo, e suas observações provocaram uma onda de reações políticas e jurídicas. Essas declarações se tornaram alvo de contestação judicial, movida pelo próprio Boulos, que obteve uma expressiva votação entre os eleitores privados de liberdade.
Na votação ocorrida nas 14 seções eleitorais instaladas em centros de detenção provisória, no presídio da Polícia Militar, em unidades da Fundação Casa e no Internato Pirituba, Boulos conquistou 73,53% dos votos válidos, um resultado expressivo frente ao candidato do MDB, Ricardo Nunes, que ficou com 26,47% dos votos entre os encarcerados. A alta adesão a Boulos nas prisões chamou atenção e gerou discussões sobre o significado desse apoio em um ambiente tão específico e que reflete uma parcela da sociedade com questões sociais e econômicas próprias.
O panorama de votação revela que, enquanto Ricardo Nunes contou com maior apoio entre a população em liberdade, a votação no sistema prisional da cidade expôs uma preferência majoritária por Guilherme Boulos. Em duas seções eleitorais localizadas em unidades prisionais, a adesão ao candidato do PSOL foi unânime. No Centro de Detenção Provisória IV de Pinheiros, situado na Zona Oeste, e no Internato Pirituba, na Zona Norte, Boulos conquistou todos os votos dos eleitores que compareceram. Essa unanimidade é um dado raro e representa um aspecto interessante da votação prisional, demonstrando a popularidade do candidato em locais onde os cidadãos enfrentam restrições e limitações de liberdade.
Por outro lado, a única exceção notável foi o resultado no Presídio da Polícia Militar, localizado no bairro de Vila Albertina, também na Zona Norte, onde Ricardo Nunes obteve a vantagem, com 32 votos, enquanto Boulos ficou com apenas três. Esse cenário isolado de apoio a Nunes é peculiar, especialmente considerando que o local abriga policiais detidos, em um ambiente diferenciado em comparação com as demais unidades de detenção provisória.
O quadro das urnas instaladas nas prisões reflete um aspecto da campanha de Boulos, que prioriza pautas relacionadas a direitos humanos e inclusão social, temas que podem ter tido eco entre a população carcerária. O candidato tem um histórico de defesa dos direitos de minorias e um discurso voltado para a redução da desigualdade e a ampliação do acesso a direitos básicos. Nesse contexto, é possível que as propostas de Boulos tenham ressoado mais fortemente junto a esse eleitorado específico, com expectativas de políticas públicas mais voltadas para justiça social e recuperação.
O fato de que Guilherme Boulos teve uma recepção favorável nas prisões também tem gerado críticas e comentários por parte dos oponentes, que associam essa votação à linha ideológica do candidato e ao público em questão. Governador Tarcísio, em suas declarações, sinalizou uma interpretação dos resultados em centros de detenção como reflexo de um alinhamento político, o que, por sua vez, motivou a resposta de Boulos e de seus apoiadores. Eles veem nas declarações uma tentativa de deslegitimar a votação do candidato entre esses eleitores, além de sustentar que a expressão política é um direito que não deve ser vinculado a uma imagem negativa.
O uso de unidades prisionais como seções eleitorais é parte de uma política de ampliação dos direitos de voto para detentos provisórios e jovens infratores. A Constituição brasileira permite que indivíduos em prisão provisória possam exercer o direito ao voto, uma vez que não possuem condenação definitiva, ao contrário dos que já cumprem pena por sentença transitada em julgado, que são privados desse direito. Essa disposição busca assegurar que todos os cidadãos brasileiros, dentro das condições constitucionais, possam participar do processo democrático, independentemente de sua situação judicial.
A contestação judicial movida por Boulos frente às declarações de Tarcísio reflete a polarização que permeou a campanha eleitoral e continua a influenciar o cenário político em São Paulo. As eleições de 2024 marcam uma disputa acirrada entre forças políticas com ideologias divergentes, e o debate sobre os resultados em locais de privação de liberdade é mais um capítulo desse embate. Resta agora aguardar os próximos passos do processo judicial, que pode ajudar a esclarecer as interpretações sobre a votação nas prisões e a responder às alegações de ambas as partes.