Nas eleições municipais deste ano, o cenário político revelou que a direita encontrou barreiras significativas em importantes capitais brasileiras, como Manaus, Goiânia, Fortaleza, Belém, Belo Horizonte e Rio de Janeiro. Em todas essas cidades, os candidatos alinhados ao espectro político de direita foram derrotados, um desfecho atribuído, em grande parte, ao fato de terem sido lançados com um rótulo ideológico explícito e conservador. Esse perfil, marcado pela inclinação política visível e pelo conservadorismo declarado, encontrou dificuldade em obter a simpatia e o apoio dos eleitores dessas grandes cidades, que, historicamente, demonstram uma inclinação progressista em suas escolhas eleitorais.
O contexto das capitais brasileiras sugere uma predileção pela diversidade ideológica e por posturas políticas menos conservadoras, o que inviabilizou candidaturas associadas explicitamente à direita. Esse fenômeno já vinha sendo observado em ciclos eleitorais anteriores, onde candidaturas conservadoras frequentemente encontraram mais sucesso em municípios menores e em regiões com perfis eleitorais mais homogêneos, em vez de nos grandes centros urbanos. Em contraste, o perfil das capitais, mais dinâmico e plural, tende a favorecer propostas que dialoguem com uma agenda mais inclusiva e progressista, o que contribuiu para a vitória de candidatos de esquerda ou centro-esquerda nessas regiões.
São Paulo, contudo, revelou-se uma exceção nesse contexto, e isso se deve, em grande parte, à estratégia adotada pelo ex-presidente Jair Bolsonaro. Em vez de optar por um candidato de direita explícita, como fez nas outras cidades, Bolsonaro abriu mão de lançar um candidato de perfil intransigente e alinhado abertamente ao conservadorismo, optando por apoiar Ricardo Nunes, candidato que se posiciona de maneira mais centrista. Nessa aliança, Bolsonaro garantiu espaço à direita colocando um candidato como vice na chapa de Nunes, mas sem assumir uma posição ostensivamente polarizadora. Essa escolha calculada foi fundamental para garantir a vitória em São Paulo, evitando que o candidato de esquerda, Guilherme Boulos, obtivesse a maioria dos votos e se tornasse o prefeito da maior cidade do país.
A decisão de Bolsonaro de abrir mão de um candidato próprio em São Paulo foi interpretada como um movimento estratégico para evitar a vitória de Boulos. O ex-presidente teria deixado de lado o ego e a insistência em uma candidatura exclusivamente conservadora, compreendendo que uma eventual derrota em São Paulo seria mais prejudicial para o alinhamento político na cidade e, de modo geral, para o projeto político da direita no estado de São Paulo. O contexto local demandava, segundo a avaliação de Bolsonaro e seus aliados, uma escolha pragmática, onde a direita ainda pudesse ter voz, mas sem arriscar o controle da prefeitura a um adversário fortemente identificado com a esquerda.
Ao analisar o cenário em outras capitais, é possível perceber que, para Bolsonaro e seus apoiadores, arriscar uma candidatura de direita explícita em locais como Belo Horizonte e Goiânia não representava uma perda política tão significativa quanto em São Paulo. Nessas capitais, os adversários eram majoritariamente de centro, o que diluía o impacto de uma eventual derrota para a esquerda, permitindo uma tentativa de consolidação de candidatos com bandeiras conservadoras, ainda que com menor chance de vitória. Em Fortaleza, Manaus e Belém, por outro lado, a esquerda já contava com uma base eleitoral consolidada, dificultando ainda mais as chances de vitória para candidatos alinhados a Bolsonaro. Nesses locais, apesar do esforço dos candidatos de direita, como André Fernandes em Fortaleza, que quase alcançou a vitória, os resultados finais confirmaram a preferência progressista dos eleitores.
O caso de São Paulo, contudo, apresentou implicações políticas que ultrapassavam o resultado de uma eleição municipal. Bolsonaro sabia que, caso Guilherme Boulos fosse eleito, a situação do governador Tarcísio de Freitas se complicaria, pois ele ficaria "emparedado" entre uma prefeitura de oposição e o governo federal. Esse cenário poderia comprometer o avanço de projetos estaduais e limitar a atuação da administração de Tarcísio na capital, um efeito político indesejado pela direita.
Essa análise das eleições municipais e da atuação de Bolsonaro ao escolher seus candidatos indica uma mudança de postura estratégica. Compreender as particularidades de cada capital e adotar uma abordagem mais pragmática foram fatores decisivos para alcançar um resultado positivo em São Paulo. A experiência desta eleição parece sugerir que a direita deve adotar uma leitura mais cuidadosa do cenário político e do perfil de cada região, especialmente nas capitais onde a inclinação progressista dos eleitores tende a dificultar a ascensão de candidatos explicitamente conservadores.
Com a vitória de Nunes, Bolsonaro evitou o "mal maior" que seria a eleição de Boulos, mantendo a capital paulista alinhada ao governo estadual e com maior possibilidade de interação em projetos de longo prazo. A escolha de uma aliança com o centro, ao invés da insistência em uma candidatura puramente conservadora, mostra uma disposição da direita em flexibilizar suas táticas quando necessário, um passo que, para analistas, poderá moldar as futuras estratégias eleitorais no Brasil.