Velha mídia começa a se insurgir contra Moraes


 A atuação do ministro Alexandre de Moraes como relator dos processos envolvendo Jair Bolsonaro e outros acusados na suposta tentativa de golpe de Estado tem gerado intensos debates no meio jurídico e político. O jornal O Estado de S. Paulo publicou uma análise que coloca em xeque a imparcialidade de Moraes, destacando que sua condição de vítima em algumas dessas ações pode abrir brechas para a contestação das decisões e até mesmo para a anulação de sentenças no futuro. Juristas consultados pela publicação reforçam que a continuidade de Moraes como relator pode comprometer a credibilidade do Supremo Tribunal Federal (STF), ao mesmo tempo em que alguns ministros defendem sua permanência como uma garantia de continuidade processual.


Para Gustavo Sampaio, professor de Direito Constitucional da Universidade Federal Fluminense (UFF), o afastamento do ministro seria fundamental para resguardar a imagem da mais alta corte do país. Segundo ele, é importante evitar que o tribunal seja alvo de suspeitas sobre sua isenção. “É de toda prudência que o ministro se afaste da relatoria, para que o tribunal não fique sob suspeita. Isso preservaria mais a imagem da instituição”, afirma. Ele aponta que, em situações delicadas como essa, as aparências são tão importantes quanto a própria imparcialidade, dado o impacto político e social que os julgamentos do STF geram.


Wálter Maierovitch, ex-desembargador do Tribunal de Justiça de São Paulo, também critica a dualidade entre vítima e julgador no mesmo processo, ressaltando os danos à percepção internacional do Brasil. “Como o Brasil vai ser visto internacionalmente com um juiz que é vítima e julgador? Isso é estarrecedor para quem atua no direito processual”, pontuou. Para ele, a manutenção de Moraes na relatoria representa um ponto frágil na condução do caso, que pode ser explorado tanto no cenário interno quanto externo.


Marcelo Crespo, especialista da ESPM, compartilha a mesma visão, argumentando que o afastamento do ministro seria uma medida preventiva para proteger o Supremo de possíveis questionamentos futuros. Para ele, a saída de Moraes da relatoria não enfraqueceria o tribunal, mas reforçaria sua legitimidade diante da sociedade e da comunidade jurídica. Crespo enxerga o ato como um “resguardo” para evitar interpretações de que o processo contra Bolsonaro e outros acusados estaria comprometido pela figura de um ministro diretamente envolvido nos fatos.


Entretanto, nem todos compartilham da ideia de afastar Alexandre de Moraes. Ministros como Gilmar Mendes saíram em defesa de sua permanência como relator, alegando que ele está na posição desde o início do processo e que sua atuação como vítima decorre do exercício do papel institucional que ocupa, e não de uma relação pessoal com os acusados. “Desde sempre, o ministro Moraes tem sido o relator desse processo. Afastá-lo seria absurdo. Ele é vítima por cumprir seu papel institucional, não por uma relação pessoal com os réus”, afirmou Mendes. Para ele, a retirada de Moraes da condução do caso configuraria uma mudança de paradigma que poderia gerar ainda mais instabilidade nos julgamentos em andamento.


Apesar do consenso entre muitos juristas sobre a necessidade de Moraes se afastar, a decisão final recai sobre o próprio STF. Até o momento, não há sinais de que o tribunal esteja disposto a rever a posição do ministro como relator, mesmo diante das críticas. Segundo analistas, essa escolha reflete não apenas uma questão jurídica, mas também uma leitura política do cenário atual, em que o Supremo tenta preservar sua coesão interna e sua capacidade de enfrentar os desafios institucionais trazidos por processos de tamanha relevância.


A polêmica se intensifica em um contexto de alta polarização, em que os desdobramentos dos processos são vistos por muitos como uma tentativa de fragilizar o ex-presidente Jair Bolsonaro. Para seus apoiadores, as ações judiciais e a postura de Alexandre de Moraes seriam parte de uma estratégia deliberada para inviabilizar politicamente o ex-mandatário. Há quem acredite que o sistema, como um todo, busca explorar qualquer narrativa para justificar sua prisão ou deslegitimar sua atuação na política.


Enquanto o debate jurídico avança, o STF permanece sob os holofotes, com sua imagem sendo avaliada tanto no Brasil quanto no exterior. A decisão sobre o futuro de Moraes como relator terá implicações que vão além dos processos específicos, afetando a percepção da sociedade sobre a imparcialidade da Justiça e o equilíbrio entre os poderes. Independentemente do desfecho, o caso ilustra a complexidade de se lidar com figuras públicas tão polarizadoras quanto Bolsonaro, bem como os desafios de manter a confiança no sistema judicial em tempos de crise política e institucional.
Jornalista