Alckmin toma coragem e se manifesta sobre a posse de Maduro


O vice-presidente da República, Geraldo Alckmin, decidiu romper o silêncio e se posicionar sobre um tema que tem causado intenso debate no cenário político internacional: a posse de Nicolás Maduro para um terceiro mandato consecutivo na presidência da Venezuela. A cerimônia, realizada nesta sexta-feira (10), foi marcada por protestos e questionamentos acerca da legitimidade do processo eleitoral que garantiu mais seis anos de poder ao líder venezuelano.

Em uma declaração que surpreendeu alguns setores do governo, Alckmin classificou como “lamentável” a recondução de Maduro ao cargo. O vice-presidente destacou que a democracia deve ser um pilar civilizatório e precisa ser constantemente fortalecida, uma mensagem que ecoa críticas à condução política do governo venezuelano. Essa postura evidencia uma tentativa de equilíbrio por parte de Alckmin, que se distanciou, ainda que de forma sutil, da linha adotada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva em relação ao tema.

A presença de uma representante brasileira na cerimônia de posse foi alvo de críticas tanto na oposição quanto em setores independentes. O governo de Lula, embora oficialmente não tenha reconhecido a vitória de Maduro, enviou a embaixadora Glivânia Oliveira para representar o Brasil no evento. A decisão foi vista por muitos como um gesto contraditório e, para alguns críticos, até como uma vergonha diplomática. Esse movimento gerou reações de insatisfação entre analistas e parlamentares, que questionaram a coerência da política externa brasileira.

Alckmin, ciente do desgaste político que a situação representa, tentou minimizar o impacto da decisão de enviar uma representante oficial. Ele lembrou que o governo brasileiro, em sua posição oficial, não reconheceu a vitória de Maduro, indicando que o envio de Glivânia Oliveira poderia ser interpretado mais como um gesto protocolar do que um endosso à legitimidade do governo venezuelano. No entanto, o gesto foi amplamente criticado por ser percebido como um sinal de complacência diante das denúncias de irregularidades nas eleições da Venezuela.

A manifestação de Alckmin ocorre em um momento delicado para o governo, que enfrenta crescente pressão para adotar uma postura mais firme em relação à crise política e humanitária que afeta a Venezuela. A postura do vice-presidente sugere uma tentativa de preservar sua imagem como moderado e defensor de valores democráticos, o que contrasta com a estratégia mais pragmática adotada por Lula, que busca manter um canal de diálogo com Maduro. Essa divisão de posicionamentos no alto escalão do governo alimenta questionamentos sobre a unidade da política externa brasileira.

A posse de Maduro também reacendeu debates sobre o papel do Brasil na América Latina. Enquanto setores do governo defendem uma postura de diálogo e integração regional, críticos alertam para o risco de o país ser visto como conivente com regimes autoritários. A presença da embaixadora na posse de Maduro foi amplamente explorada pela oposição, que classificou a decisão como um erro estratégico e uma afronta aos valores democráticos.

Para além das declarações de Alckmin, a situação expõe um dilema que tem se tornado recorrente na política externa brasileira: como equilibrar pragmatismo diplomático com a defesa de princípios democráticos. A relação com a Venezuela, um vizinho estratégico, mas politicamente conturbado, coloca o Brasil em uma posição sensível. Se, por um lado, a diplomacia exige cautela e diálogo, por outro, há uma crescente cobrança interna e externa por posições mais firmes em defesa da democracia.

Os próximos desdobramentos dessa questão serão determinantes para medir o impacto político das declarações de Alckmin e da decisão do governo brasileiro de enviar um representante à posse. Enquanto isso, a oposição não parece disposta a recuar em suas críticas e promete usar o episódio como munição para atacar o governo em temas como democracia, direitos humanos e coerência diplomática.

Em meio a esse cenário, Alckmin tenta consolidar sua posição como um contraponto moderado dentro do governo, buscando manter seu perfil de estadista e sua credibilidade junto a setores que cobram uma postura mais contundente contra regimes autoritários. Sua declaração sobre a posse de Maduro, embora cuidadosa, sinaliza um incômodo com a condução da política externa em relação à Venezuela e abre espaço para novos questionamentos sobre os rumos do governo em temas de alcance internacional.

O episódio reforça a complexidade do papel do Brasil na geopolítica latino-americana e os desafios de alinhar suas ações externas aos valores democráticos que tanto defende. Alckmin, ao se manifestar, pode ter dado início a uma discussão interna mais ampla sobre os limites do pragmatismo na política externa e o custo de decisões que, para muitos, colocam em xeque os compromissos do país com a democracia.

Jornalista