A vida de Jhonatan, 17, mudou completamente em cinco dias. Na segunda-feira, 26 de julho, há um mês e dois dias, ele chegou para uma semana de testes no Palmeiras. Treinou dois dias com o sub-20, pois o sub-17 havia sido eliminado do Brasileiro e haveria uns dois dias de broncas, dos quais um novato em período de teste não precisava mesmo participar.
Assim, foi só na quarta que o meia treinou com os colegas da categoria para a qual tentava entrar. Segundo ouviu depois, treinou mal na quarta, treinou mal na quinta. Na sexta, fez um ótimo trabalho. No sábado, 31 de julho, estreou contra o Sub-23 do São Caetano com duas assistências, na vitória por 4 a 1. E foi avisado de que permaneceria. Neste sábado (28), com pouco mais de um mês de clube, ele vai para seu segundo jogo oficial pelo Palmeiras. Às 11h, vai a Guarulhos enfrentar o Flamengo local pela primeira fase do Campeonato Paulista Sub-17.
Jonathan nunca havia estado nas categorias de base de um clube antes. Aos 11 anos, fez dois testes no Santos, em cuja unidade de uma escolinha treinava, na sua Itaquaquecetuba, e não passou. Da Baixada, ao menos voltou com uma nova posição. Chegou como ponta, saiu como meia. No início da pandemia, em 2020, fez um teste no São Paulo, depois de anos apenas disputando jogos na várzea.
"O elenco deles já estava fechado para o Campeonato Brasileiro, e não olharam para mim como deviam", disse ele, ao UOL. A afirmação forte veio sem qualquer empáfia. Apenas evidenciou a confiança reconquistada.
Jonathan já havia até avisado a mãe, Regina, de que só tentaria ser jogador de futebol, única profissão que desejou na vida, até o fim do ano. "Quando me relacionaram para enfrentar o São Caetano, me disseram que era minha única chance. É que eu só estava indo para o jogo por causa do meu treino de sexta-feira. Eu não podia deixar passar", diz. Jhonathan quase se chamou Denilson, porque o pai, Flávio, era fã do pentacampeão mundial ex-São Paulo e Palmeiras. "Prefiro Jonathan", diz ele.
Pouco tempo depois daquele amistoso, no último dia 19, ele estava no Allianz Parque para encarar a Desportiva-PA pela Copa do Brasil de sua categoria. Fechou a goleada por 9 a 0 com um gol. "Eu nunca tinha estado em um estádio grande. Foi uma sensação louca, parecia sonho. Num mês, você está sem nada. E, no outro, você está pisando no Allianz Parque", diz. "O estádio é ainda maior do que eu imaginava", afirma.
E a grama sintética? Estranhou? "Não. A gente já tinha treinado na Academia de Futebol, onde também tem campo do tipo. E eu vinha jogando na terra batida da várzea, né? Como vou achar grama sintética ruim?", disse ele, cujo orgulho de vestir a camisa do Palmeiras transborda em cada fala.
Jonathan x 200 garotos
A história de Jhonatan é um pouco fora da curva. Aos 17, a maior parte dos garotos que vão vingar já estão em clubes. Já ele estava trabalhando no restaurante de sua tia quando participou de uma espécie de peneira, com mais 200 garotos. "Eu disse para a minha tia que ainda tinha um desejo no coração de ser jogador, e ela entendeu", conta ele.
No dia da tal peneira, Jhonatan e um outro menino impressionaram o empresário Adriano Ribeiro, que o levou para um projeto em Santa Isabel, na região de Arujá. Lá, onde hoje mora, treinava em dois períodos para estar no mesmo ritmo físico dos jogadores que estão nos clubes. E foi no projeto de Ribeiro que Jorge, observador do Palmeiras, o viu em ação e decidiu trazê-lo para um período de testes no Alviverde.
Jhonathan, como a maior parte dos garotos de sua idade, gosta de videogame. Mas procura assistir ao máximo de jogos de futebol que pode. Ele gosta de se inspirar e acredita que seu estilo de jogo seja semelhante ao de Modric, do Real Madrid, e gostaria de ter visto Rivaldo jogar. "Eu também acho que tem algo dele no meu jogo", diz. Pouco marketing e muita bola?, indaga a reportagem. "É, acho que é mais ou menos isso", diz Jonathan, entre risos.
Mas o jogo que nunca saiu de sua memória foi a semifinal da Champions League de 2019, quando o Tottenham, que perdia por 2 a 0, bateu o Ajax de virada, com três gols de Lucas Moura, que veio do banco. "Cê é louco! Aquilo ali arrepiou", disse ele.
É verdade. Histórias de grandes viradas arrepiam mesmo. Ainda mais fora do campo, como é a sua, Jonathan.