Milei bloqueia indicação de Lula

 

O recente impasse envolvendo o presidente argentino Javier Milei e o governo brasileiro, liderado por Luiz Inácio Lula da Silva, ganhou mais um capítulo delicado com o bloqueio da indicação do economista Luciano Wexell Severo para o cargo de coordenador-executivo da Unidade Técnica do Fundo de Convergência Estrutural do Mercosul (Focem). O fundo, criado em 2004, tem como objetivo reduzir as assimetrias entre os países membros do bloco, financiando projetos de infraestrutura com foco nas áreas de fronteira. Contudo, a indicação de Severo, feita pelo governo Lula, vem sendo barrada pela Argentina, o que tem gerado tensões nos bastidores da diplomacia sul-americana.


A indicação de Severo, um economista que já atuou em diversas funções ligadas ao Mercosul, foi apresentada oficialmente pelo Brasil em maio deste ano. O Uruguai, parceiro do bloco, imediatamente apoiou a candidatura, seguido pelo Paraguai. Entretanto, a Argentina, sob a liderança de Milei, tem se mantido firme em bloquear a nomeação, apresentando argumentos baseados em questões administrativas e históricas. Segundo ata oficial da reunião do Conselho de Administração do Focem, disponível no site do Mercosul, a delegação argentina argumenta que, desde 2007, a unidade técnica do fundo vem funcionando sem um coordenador-executivo titular, e que outras candidaturas anteriores também não tiveram sucesso, justificando assim o bloqueio.


Nos bastidores, fontes indicam que o bloqueio argentino vai além de questões técnicas. A postura de Milei em relação ao Mercosul sempre foi marcada por ceticismo. Durante sua campanha presidencial, ele chegou a prometer a saída da Argentina do bloco, uma medida que não foi concretizada após sua eleição, mas que ainda ecoa em suas políticas externas. Embora sua chanceler, Diana Mondino, tenha trabalhado para evitar medidas drásticas em relação ao Mercosul, a falta de prioridade dada ao bloco por Milei é evidente, como demonstrado pela ausência do presidente na cúpula de chefes de Estado do Mercosul, realizada em julho deste ano em Assunção, Paraguai. Em vez de participar do evento diplomático, Milei optou por estar presente em uma conferência de conservadores em Balneário Camboriú, ao lado do ex-presidente brasileiro Jair Bolsonaro.


Para o governo Lula, o bloqueio à indicação de Severo é particularmente frustrante. A nomeação do economista foi feita logo após o Brasil quitar uma dívida de aproximadamente 99 milhões de dólares com o Focem, permitindo, assim, que cerca de 70 milhões de dólares disponíveis no fundo fossem alocados em projetos no território brasileiro. Esses projetos, segundo as regras do Focem, precisam estar localizados em uma faixa de até 150 quilômetros da fronteira, com o objetivo de trazer benefícios tanto ao Brasil quanto aos países vizinhos. A expectativa do governo brasileiro era que Severo, uma vez confirmado no cargo, pudesse acompanhar de perto a implementação desses projetos, fortalecendo a integração regional.


O Brasil, como o maior integrante do Mercosul, é responsável por 70% do aporte anual ao Focem, enquanto a Argentina contribui com 27%. Já o Uruguai e o Paraguai têm participações mais modestas, contribuindo com 2% e 1%, respectivamente. No entanto, os maiores beneficiários do fundo são os países menores: o Paraguai recebe 48% dos recursos, seguido pelo Uruguai com 32%, enquanto Brasil e Argentina ficam com apenas 10% cada. Esse equilíbrio de contribuições e recebimentos é uma característica fundamental do Focem, desenhado para promover a equidade entre os membros do bloco.


Apesar das tentativas de negociação por parte do Brasil, o governo argentino continua a se opor à nomeação de Severo, repetindo os mesmos argumentos em diversas reuniões do Mercosul. A posição argentina, no entanto, pode ser interpretada como parte de um jogo político mais amplo, onde Milei tenta reafirmar sua postura crítica ao Mercosul e se distanciar de iniciativas lideradas pelo governo Lula, com quem tem tido embates frequentes em outras frentes diplomáticas.


Procurado para comentar sobre o impasse, o Ministério do Planejamento do Brasil afirmou que a indicação de brasileiros para cargos em organismos multilaterais é uma questão que envolve negociações conduzidas pelo Itamaraty, a chancelaria brasileira. A pasta, comandada por Simone Tebet, ressaltou que, apesar da demora na confirmação de Severo, o funcionamento do Focem não está prejudicado. No entanto, o prolongamento do impasse pode minar os esforços de cooperação no âmbito do Mercosul, especialmente em um momento em que a integração regional enfrenta desafios significativos.
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