Em uma entrevista transmitida no último domingo (10), o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), declarou que "Maduro é problema da Venezuela, não do Brasil". Segundo Lula, seu foco é governar o Brasil e deixar que o presidente venezuelano Nicolás Maduro e o povo da Venezuela lidem com suas próprias questões internas. Ele frisou: "Eu vou cuidar do Brasil, o Maduro cuida dele, o povo venezuelano cuida do Maduro, e eu cuido do Brasil. E vamos seguir em frente".
As declarações de Lula foram feitas durante uma conversa com os senadores Jorge Kajuru (PSB-GO) e Leila Barros (PDT-DF), que foi gravada pela RedeTV! na quarta-feira passada (6) e exibida na íntegra no domingo. Na entrevista, Lula destacou a importância de manter uma postura de respeito na relação com outros países. “Eu aprendi que a gente tem que ter muito cuidado quando a gente vai tratar de outros países e de outros presidentes. Eu acho que o Maduro é um problema da Venezuela, não é um problema do Brasil. Eu quero que a Venezuela viva bem, que eles cuidem do povo com dignidade”, disse o presidente.
Lula afirmou ainda que não pretende se preocupar com "ruídos diplomáticos" desnecessários e que sua prioridade é trabalhar pelo Brasil. Ele criticou a abordagem de se envolver em conflitos diplomáticos com outros países, como Nicarágua e Venezuela, dizendo que seu foco é fazer o país crescer e funcionar adequadamente.
O presidente brasileiro também abordou as eleições presidenciais na Venezuela, que resultaram na reeleição de Maduro. Esse processo foi questionado pela oposição e por órgãos internacionais, incluindo o Brasil, que emitiu um pedido de transparência na apuração. Segundo Lula, o Brasil acompanhou o processo e, após as eleições, o assessor especial Celso Amorim solicitou a Maduro e ao candidato da oposição, Edmundo González Urrutia, que mostrassem as atas da votação. Ambos prometeram fazê-lo, mas não cumpriram a promessa, o que gerou desconfiança sobre a integridade do processo.
Após o evento, o governo brasileiro e o da Colômbia publicaram uma nota expressando preocupação com a falta de provas concretas do resultado eleitoral. Lula relembrou que Maduro deveria ter enviado a nota para o Conselho Nacional Eleitoral da Venezuela, que inclui membros da oposição e do governo, mas, em vez disso, optou por encaminhar diretamente à Suprema Corte. Sobre esse ponto, Lula afirmou que respeita a independência das instituições e não tem o direito de questionar a Suprema Corte de outro país, assim como espera que o Brasil não tenha suas próprias decisões judiciais questionadas por outras nações.
Apesar do histórico de relações próximas entre Lula e Maduro — o presidente venezuelano foi recebido como chefe de Estado no Brasil em 2023 —, a situação entre os dois países tem enfrentado dificuldades ao longo de 2024, especialmente durante o período eleitoral. A exclusão de María Corina Machado, líder da oposição, da corrida eleitoral foi um dos fatores que geraram atritos. Na época, o Itamaraty, em nota oficial, declarou que o Brasil acompanhava a situação com "preocupação". Em resposta, o governo venezuelano se mostrou insatisfeito com o posicionamento brasileiro.
Outro ponto de tensão surgiu quando Maduro afirmou que as eleições no Brasil não são auditadas, uma acusação rebatida prontamente pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE), que garantiu a transparência e a segurança do sistema eleitoral brasileiro. Em outubro, uma nova crise diplomática surgiu quando o Brasil vetou a entrada da Venezuela no bloco econômico Brics, formado por Brasil, Rússia, Índia, China e África do Sul. Em resposta, a Venezuela classificou a posição brasileira como uma "agressão inexplicável". Celso Amorim, que atua como assessor especial de Lula para assuntos internacionais, mencionou que essa atitude gerou uma "quebra de confiança" entre os dois países, sobretudo em relação ao processo eleitoral venezuelano.
Além disso, as relações diplomáticas foram tensionadas quando a Polícia Nacional Bolivariana da Venezuela publicou uma imagem com a bandeira do Brasil, fazendo referência a Lula e acrescentando uma mensagem de tom intimidador: "Quem mexe com a Venezuela se dá mal". A postagem foi posteriormente removida, mas já havia gerado polêmica. Para reforçar o descontentamento, o governo venezuelano convocou de volta seu embaixador em Brasília, Manuel Vadell, em um gesto que tradicionalmente simboliza desaprovação e que demonstra que o governo venezuelano não se sente mais acolhido no Brasil.
Em resposta, o Itamaraty emitiu uma nova nota expressando "surpresa" com o tom ofensivo adotado por representantes do governo venezuelano e ressaltou o respeito que o Brasil tem pelos seus próprios símbolos nacionais e pela sua soberania. Em contrapartida, o governo de Maduro classificou a atitude do Brasil como uma "agressão", acusando o país de interferir nos assuntos internos da Venezuela.
As tensões entre os dois países representam um desafio para a diplomacia brasileira, que busca manter um equilíbrio entre apoiar a democracia e respeitar a soberania dos países vizinhos. Mesmo diante dos conflitos, Lula reforçou sua posição de não interferir diretamente nos assuntos internos da Venezuela, enfatizando seu compromisso com o desenvolvimento do Brasil e sua postura de respeito com relação às instituições e à política dos países vizinhos.