Em uma decisão que traz novos contornos para o ambiente político de São Paulo, o ministro Kassio Nunes Marques, do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tomou a primeira medida em relação à notícia-crime apresentada pelo deputado federal Guilherme Boulos (Psol-SP) contra o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos). A medida de Nunes Marques determinou o envio do caso à Procuradoria-Geral Eleitoral (PGE), que analisará os próximos passos em relação às acusações feitas por Boulos contra o governador.
A denúncia apresentada por Boulos refere-se a declarações feitas por Tarcísio em 27 de outubro de 2024, durante o segundo turno das eleições municipais em São Paulo. Em seu relato, o deputado afirma que Tarcísio divulgou informações falsas ao associar o grupo criminoso Primeiro Comando da Capital (PCC) ao apoio eleitoral a Boulos. Segundo o governador, mensagens interceptadas em presídios paulistas indicavam que a facção teria orientado eleitores a votar em favor de determinados candidatos, citando o nome de Boulos como um dos supostos beneficiados. A declaração do governador foi feita durante um evento público ao lado do prefeito reeleito de São Paulo, Ricardo Nunes (MDB), o que gerou repercussão imediata na mídia e entre o eleitorado paulista.
Na visão de Boulos, a fala do governador não só carecia de fundamentação, mas também teve o propósito de manipular o eleitorado ao atribuir uma ligação entre o candidato e o crime organizado. A representação apresentada por Boulos ao TSE caracteriza essa declaração como uma tentativa de interferir no processo eleitoral, atribuindo-lhe um teor de fake news com potencial para impactar negativamente sua imagem e influenciar a percepção dos eleitores a seu respeito. Com base nisso, Boulos pede que a Procuradoria-Geral Eleitoral tome providências legais, sugerindo que se abra um inquérito policial para investigar o caso ou até mesmo que a PGE ofereça uma denúncia diretamente contra o governador.
Em resposta à acusação, Tarcísio defendeu a veracidade de suas afirmações, reiterando que elas se basearam em informações obtidas a partir de mensagens interceptadas por autoridades de segurança. Segundo ele, essas comunicações entre membros do PCC continham orientações para que eleitores apoiassem candidatos específicos, sendo Boulos um dos nomes citados nesses diálogos. O governador enfatizou ainda a gravidade da situação, afirmando que o envolvimento de facções criminosas no processo eleitoral é um problema real que merece a devida atenção e uma investigação detalhada para proteger a integridade do sistema democrático.
O episódio também levou Boulos a mover uma ação de investigação judicial eleitoral contra Tarcísio e o prefeito Ricardo Nunes no Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo (TRE-SP), com o objetivo de apurar se as declarações do governador influenciaram de maneira indevida o resultado do pleito municipal. Boulos, que perdeu a eleição para Nunes, recebeu 40,65% dos votos válidos, totalizando 2.323.901 votos, enquanto o prefeito reeleito obteve 59,35% dos votos, somando 3.393.110 eleitores a seu favor. Em sua ação, o deputado pede que o TRE-SP avalie o impacto das declarações no eleitorado, considerando que as falas do governador podem ter desviado votos em um momento crucial da campanha.
O encaminhamento da notícia-crime à Procuradoria-Geral Eleitoral pelo ministro Nunes Marques sinaliza um avanço inicial na análise do caso, mas não representa, ainda, um posicionamento definitivo sobre a veracidade das alegações de Boulos ou sobre a adequação das declarações de Tarcísio no contexto eleitoral. A PGE agora terá o papel de avaliar as evidências apresentadas e decidir se há elementos suficientes para dar continuidade a uma investigação formal ou à propositura de uma ação penal. Nesse contexto, a possibilidade de uma atuação da Polícia Federal no caso, mediante inquérito, também foi sugerida na denúncia de Boulos.
Em termos jurídicos, o caso levanta questões importantes sobre o limite entre a liberdade de expressão de autoridades públicas e a responsabilidade de evitar declarações que possam, intencionalmente ou não, induzir o público a conclusões potencialmente danosas. A jurisprudência do TSE e de outras instâncias judiciais brasileiras já demonstrou uma crescente preocupação com o fenômeno das fake news e com o uso indevido de informações para distorcer a opinião pública. Neste caso específico, a acusação de manipulação eleitoral por meio de alegações não fundamentadas é central e está no cerne da controvérsia entre o deputado e o governador.
A expectativa é que a Procuradoria-Geral Eleitoral se pronuncie em breve, trazendo novos desdobramentos para o caso. A situação também gera um clima de tensão entre os apoiadores de Tarcísio e Boulos, dado o impacto das declarações no cenário político paulista. Tarcísio, que é visto como uma figura de destaque dentro do partido Republicanos e um potencial nome para disputas futuras, enfrenta agora uma crítica direta ao seu discurso durante as eleições municipais, o que pode afetar sua imagem junto a parte do eleitorado e de seus aliados políticos.
Enquanto isso, Boulos mantém sua postura de denunciar o que considera um ataque pessoal e uma tentativa de prejudicar seu desempenho eleitoral com base em informações distorcidas. Esse episódio pode servir como mais um exemplo de como as disputas políticas e os debates sobre segurança pública e criminalidade no Brasil frequentemente se entrelaçam, muitas vezes ultrapassando os limites das questões partidárias para adentrar a arena judicial. À medida que o caso avança, será essencial observar o papel das autoridades eleitorais na manutenção da transparência e no combate à desinformação no contexto do sistema eleitoral brasileiro.